Arquitectura judicial, do séc. 20. Tribunal de 1ª instância do século 20. A composição modular das fachadas, a articulação volumétrica do edifício, com pátio ao centro, e a organização simétrica da planta prolongam o padrão classicizante da arquitectura judicial, introduzido em Portugal em 1930 com a construção do Palácio da Justiça de Coimbra (PT020603170139) que segue o modelo francês oitocentista. Para além desta questão, específica do programa judicial, importa referir que a aplicação de uma gramática de expressão classicizante não constituiu um fenómeno isolado em Portugal. Durante as décadas de 30 e 40 ocorreu na Europa Central um movimento de reacção ao ideário do Movimento Moderno, que cruzado com uma crescente orientação político-ideológica de feição nacionalista, resultou na consolidação de um discurso arquitectónico de cariz celebrativo e monumental, que teve a sua máxima expressão na obra de Albert Speer, ou no Novo Realismo de Moscovo, por exemplo. Ilustrativo deste fenómeno generalizado foi o polémico concurso internacional, aberto em 1935, para a construção do Palácio das Nações, em Genebra, no qual o júri elegeu um projecto ancorado aos códigos historicistas da tradição académica em detrimento de propostas de orientação modernista, onde se incluía um projecto desenvolvido por Le Corbusier. A construção do Palácio da Justiça de Santarém enquadra-se no âmbito mais alargado da campanha de modernização do parque judiciário nacional empreendida pelo Ministério da Justiça durante o Estado Novo. Esta acção, encetada desde 1926 pelo então ministro da Justiça Manuel Rodrigues Júnior (1889-1946), assentou em dois desígnios fundamentais: a intenção de remodelação dos mecanismos processuais e da orgânica do sistema judicial, que teve como expressão a publicação do primeiro Estatuto Judiciário logo em 1927; e a criação de uma política de dignificação dos edifícios judiciais e consequente estabelecimento de uma rede nacional. Numa política de demarcação com o regime republicano e crescente afirmação de valores de carácter nacionalista, os edifícios dos tribunais - pela natureza das suas funções instrumentais, políticas e simbólicas -, passaram a comportar funções alegóricas, celebrativas e representativas que, na generalidade dos casos, se traduziram arquitectonicamente na aplicação de convenções estilísticas de acento monumentalista e gosto classicizante. A partir da década de 50 a Direcção-Geral da Justiça procurou normalizar e tipificar as novas construções judiciais, fixando um conjunto de directrizes programáticas no que concerne à implantação do edifício, às questões de ordem gramatical e à organização funcional do espaço. Referido programa destinava-se particularmente aos tribunais de 1ª instância, cuja arquitectura deveria: a) contemplar uma "certa dignidade arquitectónica" variável consoante a categoria da comarca; b) corresponder formalmente ao "prestígio das funções" nela exercida; c) satisfazer as necessidades de ordem funcional dos vários serviços albergados; d) ser solidamente construída "pelo emprego de materiais resistentes ao uso e ao tempo"; e) respeitar as características da arquitectura da região; f) integrar uma "certa solenidade" de acabamentos, nomeadamente na Sala de Audiências. Para além destes aspectos, tratando-se de tribunais de 1ª Instância junto dos quais eram instalados serviços complementares (as conservatórias e os serviços notariais), eram oficialmente estabelecidos princípios de distribuição e hierarquização geral do espaço: o piso de entrada destinava-se a albergar os serviços das conservatórias e notário, com funcionamentos e entradas autónomas entre si; o piso superior era reservado ao Tribunal propriamente dito; as celas, arquivos e almoeda ficariam, sempre que possível, instalados num pavimento em cave, igualmente com acessos independentes. Durante o período do ministério de Cavaleiro Ferreira, entre 1944 e 1954, a arquitectura dos Tribunais e Palácios da Justiça foi quase exclusivamente delineada por Rodrigues Lima que, a par do desejo estatal de transmissão de mensagens político-ideológicas através da arquitectura e artes, contribuiu fortemente para a construção de uma imagem da Justiça e com ela do próprio Estado. Este arquitecto foi autor de 43 tribunais, notando-se no conjunto do seu trabalho a existência de uma matriz de critérios invariantes.
Observações
EM ESTUDO.