Edifício residencial multifamiliar e comercial modernista, que consagra uma variante à pesquisa formal experimentada no Hotel Vitória (v. PT031106450151 ). Dentro das diversas fachadas projectadas por Cassiano Branco nos anos 30, período intenso de produção onde se fixam modelos de prédios contaminantes da arquitectura residencial plurifamiliar da capital, esta foi das que conheceu menor difusão, embora alguns dos seus elementos de composição bem como de concepção global se possam encontrar em outros edifícios. Este imóvel, de arquitectura à época percepcionada como moderna e luxuosa, é assim de alguma forma singular.
Planta quadrangular regular, de seis pisos, sendo o último recuado e o térreo destinado a loja, apresentando cada um dos pisos dois fogos. A cobertura é em terraço. Além da entrada principal, centrada e ladeada pelos amplos vãos da garagem, o edifício dispõe de dois portões laterais, no topo do terreno, acessos aos corredores que percorrem os alçados do prédio até ao logradouro, parte dele ocupado por um terraço - corresponde à cobertura do piso térreo - e ao qual se acede por uma escada. Composição regular, baseada no simetrismo e na utilização de elementos geométricos criadores de formas que animam e ritmam as fachadas. O tratamento mais apurado recai naturalmente na frontaria. Um gume saliente, a subir da porta principal até ao terraço, define um eixo vertical centrado, desenvolvendo-se nesta orientação o pano central onde se inscrevem, a ladear o gume, dois vãos rectangulares moldurados, assim se diferenciando bem as metades esquerda e direita de habitação; os distintos pisos são depois essencialmente valorizados, segundo linhas horizontais, pelas varandas que crescem a partir do pano central e se enrolam numa forma circular final em torno do ângulo do edíficio, bem assinalado por uma coluna cilíndrica: o varão assente sobre subtil gradeamento acentua e completa este efeito geral, particularmente explorado no último piso, recuado, surgindo a varanda como um elemento de remate, abaixo do da cobertura. O piso térreo diferencia-se do corpo habitacional por um ligeiro recuo, com a superfície revestida a pedra, ficando "encoberto" pelas varandas do 1º andar, sob as quais se abrem as portas da garagem; já a entrada no edifício é rasgada no alinhamento do pano central, sendo coroada por uma pala semicircular. A intenção, subjacente a esta composição, de criar efeitos de claro-escuro através de distintos planos que ora avançam, recuam ou encurvam, está bem testemunhada nos sombreados do desenho onde, no projecto inicial, se representa o alçado principal. Nas outras fachadas a composição é mais simplificada, obedecendo no entanto aos mesmos princípios de regularidade e simetrismo: no alçado posterior a partir de esquerdo/direito tendo por eixo a escada de serviço; nos alçados laterais a partir dos pisos, reflectindo a organização interna do espaço (quarto mais amplo com duas frentes envolto pela varanda, zona correspondente aos quartos e por fim sala de jantar, também com duas frentes e dispondo de varanda a tardoz) e reintroduzindo a diferenciação dos pisos térreo e recuado face aos demais. A distribuição do espaço interno, por fogo e lida pela planta original, organiza-se a partir de um corredor longitudinal e conta com um saguão interior: para a frente, uma sala, um escritório e o quarto mais amplo da casa; para a fachada posterior, a sala de jantar, zona de engomados e a cozinha; no corredor que liga estas duas zonas abrem-se quatro quartos de áreas iguais, sendo-lhes fronteiras outras divisões mais reduzidas destinadas a "arrumações" e "dispensa", seguidas das instalações sanitárias, todas com aberturas para o saguão. No seguimento destas divisões encontramos por fim o vestiário comunicante com o hall: este o espaço que articula o exterior com o interior, permitindo ligação directa ao "escritório" e à "sala", e uma outra ao corredor. No ponto oposto da casa, outro hall faz a ligação entre dois espaços que surgem assim diferenciados na vivência doméstica: o da habitação familiar e dependências da empregada (cozinha e quarto da criada, com a respectiva casa de banho localizada no entanto no exterior, na varanda fechada por marquise).
Materiais
Betão (pavimentos, cobertura e paredes exteriores), alvenaria de tijolo (paredes interiores), madeira, mosaico de pedra e ferro;
Observações
*1 - o projecto deste imóvel encontra-se assinado por J. Bettencourt, engenheiro civil que colaborou assiduamente com Cassiano Branco, tal como o eng. Ávila Amaral. Nos diversos estudos e inventários sobre a obra deste arquitecto, o prédio da R. Nova de São Mamede aparece sempre atribuído, sem qualquer dúvida para aqueles investigadores, a Cassiano Branco, ao contrário de outros projectos em situação idêntica onde a atribuição surge a título hipotético. O motivo evocado reside na dificuldade de aprovação dos projectos deste arquitecto e no recurso a semelhante expediente para contornar o problema. No espólio de Cassiano Branco (CML) nenhum documento sobre este prédio existe.