Arquitectura piscatória, do Séc. 20, popular. Arraial de pesca que incluía habitação, escola, capela, mercearia, armazéns, centro recreativo, serviços administrativos e posto médico, conjugando elementos de arquitectura tradicional com elementos da chamada Casa Portuguesa, como os beirais, varandas e balcões, típicos do racionalismo estado-novista. A adaptação a unidade hoteleira manteve no essencial a volumetria original embora tenha levado à descaracterização do espaço interno do conjunto, com a construção de novos edifícios bem como à adulteração total do interior das habitações e das estruturas de apoio ao arraial *10. Com o Arraial do Barril, constitui um dos dois últimos arraiais de pesca do atum cuja estrutura geral ainda se conservam no Algarve. A Casa João da Silva Neto, antiga sede da Direcção do Arraial, é o edifício mais emblemático do conjunto, pela alta torre que permite grande visibilidade sobre a Ilha de Tavira.
Planta rectangular, regular, composta por pavilhões residenciais e industriais, Capela, Escola, Edifício Sede, Posto médico e Cooperativa, limitada por cerca em toda a sua extensão. Volumes articulados, massas dispostas maioritariamente na horizontal, com excepção para a Sede (Casa João da Silva Neto), disposta na vertical; cobertura diferenciada em telhados de quatro águas na maioria dos casos; de duas águas na Capela, Escola, Pavilhão residencial principal no Lg. Dr. Sousa Vaz *1 e pavilhões industriais; de três águas e coruchéu na Casa João da Silva Neto. Fachada principal a N. com dois torreões idênticos enquadrando a entrada principal do Hotel; torreão E. com janelas de ângulo recto não dispostas harmonicamente no alçado; torreão O. com três janelas em cada registo, abertas simetricamente no alçado; entrada principal ligeiramente retraída em relação às fachadas dos torreões, de um registo e acesso a partir de pequeno lanço de escadas ladeado por canteiros de flores e por acessos em rampa; uma moldura rectangular, no prolongamento da fachada dos torreões, precede as três portas principais, ladeadas por outras duas portas de cada lado, todas de verga recta; uma ampla cornija lisa coroa a entrada principal e estabelece a ligação entre os dois torreões. Para E. deste conjunto, que enquadra a entrada principal, a cerca do Arraial desenvolve-se a meia altura numa massa uniforme, de pilares e embasamento branco com balaustrada, deixando ver por trás os alçados dos antigos armazéns transformados em habitações. Para O. a cerca é directamente definida pelo alçado uniforme do grande armazém, transformado em dependências administrativas e de apoio ao Hotel, contendo ainda o acesso à garagem subterrânea. Fachada lateral E. delimitada por cerca idêntica à do lado E. da fachada principal, com os alçados terminais dos conjuntos habitacionais. Fachada S. com cerca idêntica sensivelmente até meio do Arraial, onde se localiza o portão original de acesso à ria, de volta perfeita e sobrepujado por um frontão curvo, que define o limite das construções originais; para O. do portão, desenvolve-se edifício rectangular, uniforme e bastante longo, que se prolonga em ângulo recto pela fachada lateral O. e que engloba os poucos armazéns que se situavam neste espaço do Arraial, hoje identificáveis pelas diferentes coberturas. INTERIOR: segue a divisão original em duas zonas, a habitacional a E., e a industrial a O.. Zona habitacional organizada em torno do Lg. Dr. Sousa Vaz, espaço quadrangular público onde se construíram os edifícios de apoio ao Arraial e que estabelece a ligação com todas as ruas do conjunto. As R. Patrão Joaquim Lopes *2, a N. e R. Conselheiro Ferreira de Almeida *3, a S., fazem a ligação entre o Lg. Dr. Sousa Vaz, onde se encontram os espaços administrativos e os extensos barracões habitacionais, a E. do arraial; esta zona habitacional multifamiliar integra a parte N. da R. Patrão Joaquim Lopes, a parte S. da R. Cons. Ferreira de Almeida, a parte E. do Lg. Dr. Sousa Vaz e todas as ruas que se desenvolvem daqui até à cerca a E. do arraial, R. de Sagres, R. José Coelho de Carvalho *4 e R. Manuel Garrocho *5; existem diferenças entre as moradias do primitivo complexo habitacional, determinadas pelo número de efectivos de cada família, variando as casas em número de quartos (dois, três e quatro); nos dois extremos do Lg. Dr. Sousa Vaz as moradias têm dois pisos com varanda no segundo piso, outrora destinadas ao professor e médico do arraial. A Zona industrial desenvolve-se a O. de um eixo central N. - S. ligado entre o torreão E. e a Casa João da Silva Neto: correspondia a um amplo espaço quadrangular livre de construções onde os residentes desenvolviam as suas actividades de apoio e preparação da pesca; hoje está delimitado nas vertentes S., O. e N. por séries de quartos ligados entre si por um único corredor e possui ao centro uma piscina de forma quadrilobada *6 rodeada de relva; entre a piscina e as dependências de serviços do Hotel, a N., uma esplanada sobrelevada em relação à cota do arraial estabelece a ligação para com o átrio de entrada do Hotel, um espaço rectangular delimitado pelos dois torreões, com Sala de Visitas a E. e Balcão de Acolhimento, a O.; no piso inferior, ao nível da garagem, construíu-se uma piscina coberta e o ginásio.
Materiais
Alvenaria, ladrilho de barro, tijolo, pedra argamassada, rebocada e caiada, betão, ferro, madeira de pinho, vidro, alumínio, alcatifas, borracha, acrílico
Observações
*1 - Sousa Vaz foi um dos principais promotores da construção do novo arraial; *2- Joaquim Lopes foi um pescador célebre do Algarve, salvando muitos náufragos; *3 - o Conselheiro Ferreira de Almeida foi Ministro da Marinha, conservando-se em Faro a casa onde nasceu, o Palacete Ferreira de Almeida (v. PT050805050007); *4 - José Coelho de Carvalho foi um dos fundadores da Companhia de Pescarias do Algarve em 1835; *5 - Manuel Garrocho, pescador algarvio, foi em 1808 anunciar a D. João VI a restauração de Olhão do domínio francês; *6 - no primeiro projecto da Vila Galé a piscina adoptava a forma de atum, intenção posteriormente alterada; *7 - serviu inicialmente de ponto de venda de bens essenciais, no piso térreo, e de casa de convívio (clube ou casa do companheiro), no andar superior; *8 - construção da armação modelar do Arraial Ferreira Neto veio substituir a antiga armação do "Medo das Cascas" (também conhecida por "Armação de Tavira"), destruída pelo mar e que já existia desde o século XVI (1586); *9 - da autoria dos Arquitectos José Lamas e Carlos Duarte, este projecto previa uma adulteração dos espaços interno e envolvente do arraial bem maior da que foi efectivamente seguida: a zona industrial seria completamente adulterada pela construção de um cais e demais edifícios; a fachada N. perderia toda a sua linearidade com a construção do Museu; na zona habitacional o antigo posto médico seria destruído e a escola convertida em bar-esplanada; na zona envolvente a E. estava prevista a construção de campos de ténis com bancadas, enquanto que a S. uma piscina e um bar, bem como um restaurante em pleno canal, com acesso a partir do hotel através de um passadiço; *10 - a planta primitiva do conjunto era composta por um largo central onde se localizavam a igreja, escola, duas cisternas e diversos quarteirões com uma, duas seis, oito e dez habitações cada; existiam ainda três balneários, uma fonte, uma mercearia-café, estruturados em 6 eixos viários: três no sentido N. - S. e três no sentido E. - O.; o edifício dos balneários era de planta rectangular simples, com cobertura em telhado de 4 águas e com fachada principal rasgada por 4 vãos emoldurados de massa, duas portas e duas frestas; as habitações tinham maioritariamente um único piso com coberturas de telhado de quatro águas; a habitação principal, localizada à entrada do arraial, tinha dois pisos e torreão com cobertura em telhados de quatro águas; *11 - incluído em REN e domínio público marítimo.